Parece que vai chover…
Esta noite, foi outra vez
ponto e vírgula – a insónia vivida.
No jardim, cresce a hera
enquanto eu não durmo.
Sopra o vento.
Pergunto-me se deixarei os
meus cabelos crescerem até ao chão onde cresce a hera.
Todos os dias, espero pela
noite, como quem espera por um desvio, no caminho, para poder esgueirar-se. Mas
quando vem a noite, percebo, com horror, que é inútil: não alcanço fechar os
olhos, no grande silêncio escuro.
Podia até ser manchete nos
jornais: A MULHER INSONE. A prisão dos dias intermináveis dos quais não alcança
fugir.
O silêncio da noite virou já
crispação.
Viro o meu rosto para o silêncio
implacável. Sei que há uma hora incógnita em que, fatalmente, descerá o quebranto
da vigília insone. Não me desespero à toa!
Da minha insónia, olho pela
janela do quarto, às três da madrugada.
Parece que vai chover…
Respiro fundo e ganho uma
lucidez que me torna fabulosa, ainda que inútil!
Um instante de embriaguez – os
pés deixam de tocar o chão! Estarei a levitar?
Nestes últimos meses, ganhei
maus hábitos de vida: de manhã durmo e de noite, acordo.
A erosão vai-me desnudando até
ao osso.
A solidão faz de mim uma
assexuada. Um ser abstrato e lento – uma piada estritamente perfeita!
Na minha vida quase já não
existe quotidiano, somente insónia.
A época que estamos
atravessando é fantástica – vivemos numa eternidade de lentidão e de silêncio
inusitados que nos pode, dizem os peritos, endoidecer.
Parece que vai chover…
Estou sem resistência física,
meio mole e gelatinosa, como uma alforreca viscosa, cuspida pelo mar.
Estou sobrando nesta aridez silenciosa
onde não consigo fechar os olhos.
A insónia crónica deixa-me,
penosamente, desorientada e entorpecida, no Tempo e no Espaço.
Sou uma viajante espacial, à
espera, lunática e fantasmagórica.
Estou suspensa na estratosfera
até à última ordem.
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