Dormi mal na noite passada. Oiço agora estuporadamente os dois velhos e à medida que se vão perdendo em infindáveis explanações e a parte vou-me afundando na cadeira. Dou por mim a imaginá-los em criança, de farda, nos bancos de uma escola pública salazarista ou de um colégio de jesuítas. Depois, na mocidade portuguesa. Pátria Família Trabalho. Sim. À minha frente, estão os verdadeiros pater familias polidos e indisfarçadamente perorantes. O ruído mecânico do aparelho de aquecimento sobrepõe-se à linha sonora contínua que quase me embala. Vou ouvindo bocejante as banalidades comezinhas da sua vida de reformados de longa data. O bafo quente do aparelho acentua o meu torpor. o velho apoplético lava agora a roupa suja. O outro ouve impávido com um sorrisinho indelével, de menino de coro, nos lábios finos. Eu sou o elemento exótico a impressionar. ("Comment peut-on être Persan?" Montaigne ou Montesquieu? Tendo para o segundo, mas a minha memória tem agora falhas sistémicas). Pátria Trabalho Família. Não se ofende?! "Olhe que aqui a Doutora está com pressa!"... Boa estratégia de fuga!... Inesperadamente, porém, reacende-se a brasa do inócuo discurso. "Vá lá que a Doutora quer-se ir embora!" ... Irritação. O bafo de calor artificial provoca-me agora desconforto e irritação. Uma quase náusea por overdose de palavras. Dói-me o crânio onde jaz uma pergunta sempre insidiosa: "Como é que se pode ser Português?"...
3 commentaires:
como voce escreve BEM!!!! a pergunta do fim, pode ser feita para este pais aqui ,e tbem para tantos outros...
beijos
vou estar sem computer por uns dias, esta velho como eu, beijos
Boa pergunta. Olha o Queiroz que escolheu para músicos oficiais da selecção umas ervilhas de olhos pretos!!!!
são feijões frades ó tosco ;)
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