lundi 1 février 2010

Fluidez

Dormi mal na noite passada. Oiço agora estuporadamente os dois velhos e à medida que se vão perdendo em infindáveis explanações e a parte vou-me afundando na cadeira. Dou por mim a imaginá-los em criança, de farda, nos bancos de uma escola pública salazarista ou de um colégio de jesuítas. Depois, na mocidade portuguesa. Pátria Família Trabalho. Sim. À minha frente, estão os verdadeiros pater familias polidos e indisfarçadamente perorantes. O ruído mecânico do aparelho de aquecimento sobrepõe-se à linha sonora contínua que quase me embala. Vou ouvindo bocejante as banalidades comezinhas da sua vida de reformados de longa data. O bafo quente do aparelho acentua o meu torpor. o velho apoplético lava agora a roupa suja. O outro ouve impávido com um sorrisinho indelével, de menino de coro, nos lábios finos. Eu sou o elemento exótico a impressionar. ("Comment peut-on être Persan?" Montaigne ou Montesquieu? Tendo para o segundo, mas a minha memória tem agora falhas sistémicas). Pátria Trabalho Família. Não se ofende?! "Olhe que aqui a Doutora está com pressa!"... Boa estratégia de fuga!... Inesperadamente, porém, reacende-se a brasa do inócuo discurso. "Vá lá que a Doutora quer-se ir embora!" ... Irritação. O bafo de calor artificial provoca-me agora desconforto e irritação. Uma quase náusea por overdose de palavras. Dói-me o crânio onde jaz uma pergunta sempre insidiosa: "Como é que se pode ser Português?"...

3 commentaires:

myra a dit…

como voce escreve BEM!!!! a pergunta do fim, pode ser feita para este pais aqui ,e tbem para tantos outros...
beijos
vou estar sem computer por uns dias, esta velho como eu, beijos

José Louro a dit…

Boa pergunta. Olha o Queiroz que escolheu para músicos oficiais da selecção umas ervilhas de olhos pretos!!!!

ma grande folle de soeur a dit…

são feijões frades ó tosco ;)